
Em ciberjornalismo, escrever não significa apenas produzir um texto, passa antes por “explorar todos os formatos possíveis a ser utilizados numa estória de modo a permitir a exploração da característica-chave do novo medium: a convergência”.
No dia 4 de Dezembro de 2015 realizaram-se as “III Jornadas ObCiber”, no Pólo de Ciências da Comunicação da Universidade do Porto, cujo assunto era os “20 anos de ciberjornalismo em Portugal”.
A conferência de abertura das jornadas, dada pelo professor Hélder Bastos, da Universidade do Porto, teve início as 10h tendo terminado, sensivelmente, às 11h. O tema desta apresentação era “Duas décadas de ciberjornalismo: utopias, conquistas e decepções”.
Após um breve prólogo, que permitiu uma contextualização do que é o ciberjornalismo (pdf), foi introduzido o que realmente interessava: o que mudou no jornalismo com a chegada das novas tecnologias e, mais importante que isso, o que piorou nesse campo profissional.
Numa primeira abordagem optou-se por relatar as consequências positivas. Apesar destas nos parecem por demais evidentes, é sempre bom tomar consciência que nem sempre o jornalismo se processou do modo como se processa hoje: especialmente tendo em conta que a maioria do público que compunha o auditório tinha menos de 20 anos. Neste ponto destaca-se o ênfase dado ao facto de, agora, os media noticiosos terem um alcance não só global mas também instantâneo.
Mas, mais importante que as consequências positivas são, provavelmente, as negativas – daí terem tido um maior tempo de destaque dedicadas a si. Isto porque o público em geral muitas vezes não tem consciências das falhas que estão por detrás das organizações noticiosas, especialmente no que toca ao ciberjornalismo: as redações muitas vezes não têm recursos suficientes para produzir uma notícia actualizada – e com qualidade – e muito menos para fazer uma reportagem ou dar uma “cacha”.
Além disso, este é um um “modelo sem negócio”, onde predomina o “fast food noticioso” e o “populismo noticioso”. Mais do que enumerar estes gaps, e de deixar inúmeras interrogações no ar, levando assim o seu público a questionar-se, Hélder Bastos,esforçou-se por demonstrar que tudo isto gera um “efeito dominó” – ou “efeito cascata” – que chega ao ponto mais ínfimo das redações. Ao apresentar as decepções do jornalismo denotou-se uma tentativa de alertar a plateia para o facto de as falhas do ciberjornalismo afectarem não só os profissionais da área, mas, acima de tudo, o cidadão e a qualidade da informação que a ele chega.
Uma das maiores críticas tecidas pelo antigo jornalista foi à gestão das redações noticiosas que, cada vez mais, tentam arranjar receitas através do despedimento (isto porque, como ele anteriormente referiu, o ciberjornalismo não produz lucro). O ponto alto da apresentação prendeu-se com a forte metáfora feita a este método de redução de custos: para o professor, isto é como dizer a um anoréctico que a solução para o seu problema é comer menos e exercitar-se mais.
Não se limitando a apresentar uma desaprovação, o professor universitário, justificou ainda estas atitudes por parte dos investidores e gestores, deixando mais uma questão no ar: “onde ir buscar o dinheiro?”. Após reconhecer este como sendo o problema-chave transversal às duas décadas de ciberjornalismo, Hélder Bastos, deu uma solução que, apesar de pragmática e de levantar muitas dúvidas, não deixa de ser uma hipótese: fundir micro-modelos de negócios que permitam sustentar o negócio.
A apresentação teve sempre um cunho pessoal e um tom de voz informal que permitiu pequenos “à-partes” e a expressão de uma opinião pessoal. Mas, tendo consciência que mesmo assim a sua plateia ficou “assustada” perante as distopias apresentadas, o conferencista acabou a sua apresentação com duas citações que caracterizam aquele que deve ser o pensamento de todos os jornalistas e futuros-jornalistas e que, de certo modo, tranquilizou quem começava a duvidar do futuro do ciberjornalismo: “Always look on the bright side of life” e “Eu sou um pessimista a curto prazo mas sou um optimista a longo prazo”.
Adriana Fangueiro